A escolha do título é livre... pode ser "Uma ode a Alécia", "A tristeza de te ver moribunda", "A Gata Borralheira", tanto faz. O fato é que "Aquela que está molhada pela água do mar" vive seus piores dias.
Quando ainda virgem, foste presente de Rei. Mas, aquele que te recebeu como dádiva, desdenhosamente não te quis. Mesmo tu bela e irresistível, trocou-a pelo fausto e o luxo da corte, preferindo doar-te a aventureiro de Espanha. Este que a recebeu, destemido, pacificou tua ira nativa. Retirou-lhe o véu, desnudou-a. Um a um, teus pequenos e formosos montes foram pela primeira vez tocados, acariciados. Um por um, aportaram-te os ilhéus. Por tuas fendas, singraram os mais intrépidos desbravadores. Fecundada, encheram-te de verdejantes campos. E o néctar foi visto jorrando de tuas entranhas. Invadida pelo manjar dos deuses, viste a sina de singular eldorado. Paixões desenfreadas, cobiça, traições, lutas pelo poder e terras, ensoparam-te com sangue e ódios. Cortejam-te até hoje os langorosos Almada e Cachoeira. Sequiosos, beijam-te, se abundam de sal, ao tempo em que despejam fios d’água doce em teu mar. Tua fertilidade romanceia, numa mistura de ficção e verdade. Serviste de inspiração a teus nativos, notadamente aos devaneios dos mais ilustres – Adonias e Amado. Em suas penas, viraste sinônimo de prosa, de versos, de contos... Hoje, coberta de glórias, tentam – novamente – transformar-te em atração para novos visitantes. Mas já não possuis os dotes da mocidade de outrora... Estás maltratada... Andas andrajosa e feia... Dadivosa em natureza, assiste àqueles que deveriam cuidar-te, servirem-se de ti...
Souza Neto
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