Atalaia é um pequeno povoado situado na ilha do mesmo nome, no município de Canavieiras, Bahia.
Até meados dos anos 70, a Ilha de Atalaia ficava isolada da cidade pela inexistência de ponte ligando as duas ilhas (Canavieiras é ilha fluvial). Naqueles tempos, o meio de transporte entre Atalaia e a sede eram as canoas a remo e algumas poucas a motor.
Atalaia era habitada por uma maioria de pescadores nativos (caiçaras) e, nos finais de semana, recebia a visita das famílias dos "barões" do cacau, que lá possuíam suas casas de veraneio.
Num determinado final de semana, convidado por um desses "barões", aporta à ilha um ilustre convidado. O sujeito, além da elevada instrução, era um empreendedor de muito sucesso.
Jangada de Piuba |
A pesca na ilha era totalmente artesanal - como ainda ocorre nos dias de hoje - e feita com jangadas.
Nos seus primeiros contatos com os caiçaras, o visitante observou-os jogando carteado sob as sombras dos oitizeiros, enquanto as crianças se divertiam na extensa área formada de gramados e plantas, correndo picula e jogando futebol.
Na segunda-feira, o visitante espantou-se ao ver os nativos ainda descansando sob a sombra dos oitizeiros, onde permaneciam jogando conversa fora, dando vez por outra uma pitada num chumaço de sari e ainda no jogo de canastra.
Informou-se com seus anfitriões e ficou sabendo que os caiçaras colocavam suas jangadas no mar, quando muito, um dia por semana. Geralmente, no dia em que a lua - e a maré - estavam favoráveis a uma boa pesca. Nessas saídas passavam dia e noite pescando até capturarem o pescado julgado suficiente para a manutenção de suas famílias pelo mínimo de sete dias.
A maior parte do produto da pesca era levado para a cidade (Canavieiras) onde, com o dinheiro da venda, compravam arrroz, feijão, carne, farinha, açúcar e outros gêneros de primeira necessidade, além de fumo, mortalha e cachaça.
O restante do tempo, os nativos passavam do jeito que o visitante havia observado naquele curto espaço de tempo na ilha: jogando baralho e pitando cigarros de mortalha e fumo de rolo debaixo dos pés de oiti. Suas jangadas ficavam devidamente "docadas" sobre cepos de madeira e muito bem amarradas, à salvo das ondas que subiam nas preamares. Só retornavam ao mar quando a "dona maria", soava o alarme ao fiscalizar a despensa: "Fulano, o feijão só dá pra mais tantos dias!"
Naquele mesmo dia, geralmente na boca da noite, os homens colocavam suas jangadas no mar. E, às vezes, nem era preciso o soar do alarme...! Acompanhando as fase da lua, eles já sabiam o dia certo pra nova empreitada mar adentro.
Intrigado com o que via, e cheio de conhecimento pra dar, nosso ilustre visitante dá um jeito de arrumar uma prosa com os caiçaras.
Começa dizendo:
- Se vocês pescarem cinco ou seis dias por semana, dentro de um ano, com o dinheiro que juntarem, poderão comprar um barco!
Os pescadores, entreolhando-se, dão uma trégua no carteado e continuam ouvindo as palavras bonitas e sábias daquele visitante culto.
- Em dois anos são dois barcos... Daqui a dez anos dez barcos! Daqui a vinte, vinte barcos! Pronto! Aí vocês serão empresários de uma frota de barcos pesqueiros. Poderão pagar a uma tripulação para fazer a pesca pra vocês... Não precisarão mais enfrentar os perigos do mar e, se quiserem, poderão ficar até os sete dias da semana, inteirinhos, debaixo dos oitizeiros jogando baralho e fazendo o que bem entenderem!
Ao final das palavras do visitante, um dos pescadores perguntou:
- Por que qui nóis tem qui isperar vinte ano pra fazer o qui a gente já tá fazendo agora!?
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